ARTIGOS – Sombra como metáfora da meia-luz do outono por Marina Alexiou

ARTIGOS – Sombra como metáfora da meia-luz do outono por Marina Alexiou

Primeira parte

 

Tudo começou em tempos remotos.

 Remotos o suficiente para manterem obscurecidos aspectos das ações contidas em tantos relatos, mitos, histórias e alegorias. Mas, que, mesmo sob um plano subterrâneo, conservam a sua voz, seus protagonistas e efeitos que reverberam no tempo.

Todavia, como seria esse relato?

Poderíamos iniciar falando sobre o longo caminho que leva àquela que foi “feita de nuvens”, a bela Helena. Na verdade, um simulacro, uma sombra daquela original que se quedou no Egito, não tendo presenciado, portanto, a cruenta guerra feita em seu nome.

Antes, porém, seria importante refletir sobre os muitos aspectos, significados e nuances da (palavra) sombra. Como, por exemplo: ilusão; espectro; simulacro; engano; ausência; duplo; subterrâneo; fantasmagórico; véu; efêmero; cópia; invisível; indistinto.

Que subsistem nesse intrincado trajeto onde tantas histórias se entrelaçam no laço primordial da fatalidade (atê) que a tudo e todos amarra e determina, sem perdão.

Sejam deuses, semi-deuses, ou humanos seres. Conforme Roberto Calasso, “…cada ato do mito acontece em uma história divergente que se reflete em outras, que nos tocam como pedaços do mesmo tecido”

 

Segunda parte

 

As sombras são seres de contornos indefinidos. Podem conter muitas formas. Entes de presença indetectável, como algo de ausência presente. Seu reflexo induz a esconder a magia da luz. A contar a história do mito através do seu contrário. Do seu duplo aspecto.

Roberto Calasso lembra que “para cada mito narrado, há um mito não narrado e inominado que lhe acena da sombra e que aflora em ilusões, fragmentos, coincidências…”

O corpo despedaçado de Osiris por Seth é recomposto, menos o falo, que terá um simulacro de madeira feito por Ísis, para poder trazê-lo de volta.

o Nilo é fertil como fertil era o falo de Osíris. Mas o verdadeiro se perdeu. Reina a cópia. A ilusão. O engano. Como reinaram SEMPRE, desde os tempos da primeira geração divina:

“No perpétuo banquete olímpico, um pai e um filho olhavam-se, e entre os dois cintilava, invisível a todos, mas não a eles, a foice dentada com que Cronos cortara os testículos de Ouranós”.

A presença daquilo que não é mais na sua inteireza e materialidade continua viva através de uma outra face reconstituída pelo espectro que “acena da sombra” e renova a história e o arquétipo uma vez mais.

Há que se seguir em frente….

Por MARINA ALEXIOU

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