CRÔNICAS TONS DO COTIDIANO – Entrevista com Erick Bernardes

CRÔNICAS TONS DO COTIDIANO – Entrevista com Erick Bernardes

 

ERICK BERNARDES

 Nesta edição, vocês terão a oportunidade de conhecer um pouco do Erick Bernardes, doutorando em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Mestre e Especialista em Estudos Literários pela Faculdade de Formação dos Professores da UERJ. É autor do Livro Panapaná: contos sombrios, e dos livros Cambada I, II e III: crônicas de papa-goiabas e do folheto de cordel Voz de prisão: Graciliano Ramos e Memórias do cárcere. É colunista, editor e revisor das revistas Entre Poetas e Poesias e Suplemento Araçá. Atua há quatro anos como cronista do Jornal DAKI, onde mantém uma coluna dedicada à memória da cidade de São Gonçalo. É acadêmico pesquisador e assessor de imprensa da Academia Brasileira de Literatura de Cordel (ABLC).

 

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REVISTA THE BARD– Apesar de ser clichê, eu preciso começar nossa entrevista perguntando como foi seu encontro com a escrita, principalmente, com o gênero crônica?

ERICK BERNARDES– Eu gostava de escrever quando criança, mas apenas instintivamente. Depois de adulto, trabalhando numa fábrica, continuava escrevendo por diversão. Por causa dessa vontade é que decidi estudar Letras na Uerj. Lá pude adquirir técnica, praticar e ter professores para guiar meus primeiros textos publicáveis. A crônica é um gênero flexível, por conta disso sempre foi meu gênero preferido. Depois de adulto que descobri que muitos textos escritos por mim na juventude eram crônicas.

 

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REVISTA THE BARD – O cronista tem um olhar diferenciado para o cotidiano e tem os ouvidos sempre atentos aos “causos”. Já aconteceu algum fato peculiar, engraçado ou misterioso que tenha sido inspiração para alguma crônica específica?

ERICK BERNARDES – Verdade, de fato o cronista tem por hábito atentar para o que passa despercebido pela maioria das pessoas. O detalhe, a minúcia, o invisível aos olhos do cidadão imerso em suas preocupações cotidianas. Recordo de um caso, de quando eu estava no ônibus e um senhor esquisito sentou ao meu lado. Mesmo com noventa por cento dos bancos vazios, ele insistiu em se acomodar ao meu lado. Eu estava com a história do lendário feiticeiro Luiz Caçador na minha cabeça, precisando de ideia para escrever o personagem e… pimba: eis que o tal senhor de cabelos desgrenhados e cara de bruxo me confidencia se chamar Luiz e ser morador do bairro Luiz Caçador. Deus do céu, eu me arrepio até hoje por causa dessa tamanha coincidência. Transformei o tal senhor do ônibus no próprio personagem lendário, quem sabe não foi uma ajudinha vinda do além? (risos)

 

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REVISTA THE BARD – Você é um pesquisador, suas crônicas transpassam a singeleza do cotidiano e mergulham na História. O que te levou a querer escrever sobre a cidade de São Gonçalo?

ERICK BERNARDES – Ah, isso é mesmo. O fato de eu não encontrar pela internet textos com um “quê” de elemento histórico narrados de maneira fluida, sem os engessados modelos acadêmicos, apontaram essa necessidade. Eu gosto de ler por entretenimento e aprender História ao mesmo tempo. Penso que assim como eu, há muita gente que prefere leituras assim também. Logo, escrever sobre a história oral de São Gonçalo se tornou um prazer, mas também a tentativa de suprir uma carência do gênero acerca do nosso município. Ler prazerosamente e ainda assim adquirir conhecimento histórico com textos curtos e dinâmicos casa bem com a contemporaneidade.

 

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REVISTA THE BARD – Você já publicou quatro livros e certamente, publicará outros, já pensou em viver exclusivamente da literatura?

ERICK BERNARDES -Com relação a viver de literatura, posso afirmar que é um sonho que acredito quase impossível. Muitos escritores tentaram e não conseguiram, outros até conseguiram, mas passaram por dificuldades financeiras. Posso exemplificar citando Graciliano Ramos, um gênio que custou para viver de literatura. Que dirá um mero escritor local como eu. Um sonho, talvez uma utopia. Eu já trabalhei como crítico literário profissional, consegui sobreviver, mas é diferente de viver como escritor e vender seus próprios livros.

 

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REVISTA THE BARD – Como professores e escritores, sabemos que a literatura precisa ser popularizada. No período pandêmico, pode-se observar o crescimento de pessoas que se denominam escritores nas redes sociais. Como você enxerga esse fenômeno?

ERICK BERNARDES – Bem, é como tudo na vida, um produto surgido da necessidade e, como tal, possui os vários ângulos cabíveis de serem analisados. Eu, por ter uma visão limitada acerca das redes sociais, só enxergo dois lados: um, é a abertura de possibilidades de novos contatos, mais intercâmbio entre as culturas, mas há o outro lado. Quero dizer, são muitos textos sendo divulgados, muita coisa ruim e sem critério sendo distribuída nas redes.

Eu mesmo, por vezes, me pego com um ou outro livro na mão, seja digital ou não, sem qualidade alguma. Os absurdos vão desde péssimos enredos e personagens rasos até erros sérios de língua portuguesa. Não pode, é preciso cuidado. Quem se lança à empreitada da literatura tem a responsabilidade de cuidar do que veicula.

De modo geral, após esse contexto pandêmico (que aliás ainda estamos vivendo), devemos calibrar nossos olhares críticos, sermos mais criteriosos com nossos filtros, por causa de tamanha enxurrada de escritores surgidos via redes sociais. Tudo tem seu preço, a popularização da escrita também tem, e ela custa caro.

Por FLÁVIA JOSS

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