NEM TE CONTO – Vá direto ao ponto!

NEM TE CONTO – Vá direto ao ponto!

 As sociedades contemporâneas, cheias de pessoas sempre tão conectadas, agitadas, atrasadas e sobrecarregadas contrastam muito com a sociedade que conheci no meu tempo de infância, no interior do Piauí, quando o dia parecia durar um tempo infinito e, cair da noite, ainda era possível nos reunirmos numa roda de conversa para prosear sem preocupação com tempo que passava. Claro, a memória sempre nos prega peças e, por vezes, parece que o passado saudoso é sempre melhor que o presente.

 Somos contadores de histórias e, por isso, cada história é essencialmente pessoal, única, carrega em si uma moral, lição ou aprendizado para nós e para os outros e, por isso, merece ser contada em seus mínimos detalhes, certo? Errado!

 Ao menos, se estivermos falando de contos, é importante observar que o tempo é o seu maior inimigo (e do seu protagonista também!). Lembre-se: o conto é uma narrativa breve, transcorrida em um período breve, com uma única unidade dramática.

 Eis aí um dos grandes segredos dos contos! O tempo limitado. Quando pensamos num romance (o gênero literário, não no tema da história!), o número de páginas necessárias para desenvolver a trama, apresentar as personagens e desenvolver suas histórias, objetivos e conflitos é grande, pois é preciso colocar essas personagens diante de inúmeros situações que revelam, gradativamente, sua reais motivações e desejos, e seu caráter.

 Mas o conto é um gênero de narrativa “urgente”. Não há tempo disponível para revelar informações excessivas. Por urgente, quero dizer que o conto deve ser planejado, como diz a Flávia Iriarte em seu curso de contos, “para ser lido em uma sentada”, ou seja, de uma vez. Logo, uma história com muitas informações, digressões, flashbacks, pontos de vista etc. pode quebrar o ritmo da narrativa, tornando-a longa e enfadonha. Alerta: isso não significa que devemos cortar o que é importante para a história. A dica é não adicionar coisas que, se retiradas, não farão falta para o fluxo narrativo.

 Além disso, há outro aspecto dessa urgência que precisamos observar com atenção. Sendo o conto uma narrativa curta devemos começar, como sugere a escritora e publisher Cláudia Lemes, “o mais próximos do final possível”, dessa forma o leitor já será jogado direto no meio do problema e, enquanto descobre a dimensão da situação, também vai conhecendo o protagonista e a unidade dramática da história.

 Para ilustrar a ideia, apresento dois trechos de contos escritos por mim, que usam os conceitos acima. Vamos a eles:

 

Desses Ossos Não Bebereis

 “- Para de reclamar e cava mais rápido!

 – Estou cavando, fica calmo! – Merda, como eu fui me meter nisso?

 A pergunta martela em meu cérebro. A cabeça lateja, enquanto gotas salgadas e quentes escorrem em meu rosto. Mas que opção eu tenho? Não se discute com gente louca, certo? Armada, então, menos ainda!”

 

Janela das Almas

 “Aquele grito, agudo e gelado como a culpa nos corações humanos, não permitia a ninguém dormir até que o preço fosse pago.

 Mas ele não queria dormir. Dormir era perder… e ele não estava preparado. Nenhum dos anteriores estava. Mas ele não pagaria pelos pecados alheios! Ao menos, era o que ele sussurrava para as pequeninas que carregava nos braços.”

 Ambas as histórias nos jogam, logo de cara, no meio de uma situação dramática, cheia de urgência. Embarcamos num trem já em movimento e fora de controle. Então, faça como nos microcontos a seguir: Vá direto ao ponto!

Por JOSENILSON OLIVEIRA

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