PROSA POÉTICA – P[r]o[f]es[c]ia por Jéssica Sabrina

PROSA POÉTICA – P[r]o[f]es[c]ia por Jéssica Sabrina

 Sinto que toda mulher preta é poeta e poesia, é profecia! Um dia, uma mulher vestida de “minha pele”, cantarolando uma música de origem africana, de olhos abertos e sorriso largo (mesmo que com o peso da tristeza do mundo todo no olhar) sonhou comigo, eu tenho certeza, ela me desejou aqui e agora. A G O R A: o cheiro que vem da cozinha é de feijão recém cozido e vem da mulher noite a poesia da “rendição” e não falo de escravidão, mas da multiplicação, vem da pele-escuridão os mais afetuosos milagres: milagre da vida, da criação (de receitas que compartilham amor e saciam a fome à filhos sem o nome do pai da certidão), milagre da ressurreição, principalmente, de sonhos que vem e sempre se vão. Somos poetas de todos os tempos e a palavra sempre esteve em nós; escrevemos diálogos inteiros em trocas de olhares e o mais primitivo dos sons, emitido com a boca fechada é a declamação do mais íntimo dos versos.

 Toda mulher preta tem seu próprio poema, nos gestos com as mãos, penteado, intensidade no olhar, no jeito de andar. Minha avó me olha nos olhos e meu coração sabe, exatamente, que rima usar; sua íris oferece um caramelo que nem sempre é doçura e a essência do fel já me diz tudo, ela também carrega todo o fardo do mundo; mas quando sorri é sumo de engenho e a poesia me abraça, silenciosamente, ela não precisa dizer nada, nem uma palavra e, ainda assim, declama um uni|verso inteiro.

 Sinto que toda mulher preta é poeta e poesia, é profecia; contadora da (própria) história; reza a lenda e a vó preta, protetora da alma e da memória. Toda mulher preta é semente, raiz, caule, é folha, flor, sombra do amor, é o som da vida e o silêncio da morte; toda mulher preta é o exemplo calado do melhor dos conselhos; vi nos olhos de minha avó, no abraço de minha mãe, no sorriso de minha irmã e senti, de frente ao espelho.

Por JÉSSICA SABRINA

Pular para o conteúdo