Matheus Fernando Rodrigues Cruz, natural de São Gonçalo/RJ, é psicólogo e escritor que transita entre gêneros literários como poesia, crônica e conto. É colunista no Jornal Poiésis e tem participação em diversas antologias de poesias, contos e crônicas. É amante das artes e principalmente desta que se expressa pela literatura.
Segue abaixo uma entrevista com Matheus Fernando, psicólogo e escritor.
ENTREVISTA
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REVISTA THE BARD – Sei que essa é uma pergunta clichê, mas todo escritor, precisa respondê-la em algum momento. Como foi seu primeiro contato com escrita literária?
MATHEUS FERNANDO -O meu primeiro contato com a escrita literária foi já no primeiro … Primeiro ou segundo semestre da graduação de Psicologia. Eu fazia parte de um Projeto que se chamava “Puro Informa”, onde nós (estudantes dos cursos daqui do polo de Rio das Ostras, juntamente com a coordenadora da biblioteca) fazíamos uma espécie de Tour pelo Polo Universitário com as crianças da cidade para apresentá-los. Até que um dia, a coordenadora do projeto decidiu fazer o “Puro Informa Cultura” onde cada um dos integrantes faria uma espécie de apresentação artística antes do famoso “tour” pelo polo universitário. E ela simplesmente saiu perguntando para cada um dos integrantes do projeto o que cada um fazia, uns cantavam, tocavam violão, dançavam, etc. Ao chegar até a mim ela perguntou se eu escrevia. Sem pestanejar eu respondi com um sonoro “Mas é claro”, com a confiança de um exímio e experiente escritor que até aquele momento não tinha escrito nada.
Foi onde tudo começou. Naquela noite eu escrevi minha primeira poesia cujo o título é “Vida empoeirada.” Ali eu comecei. Comecei e nunca mais parei. Eu até tinha um sonho de infância de em algum momento escrever um livro, mas quando fosse mais velho. Não sabia eu que o estopim para esse antigo sonho aconteceria no início da minha graduação, aos 19 anos idade.
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REVISTA THE BARD – Todo bom escritor, é também um bom leitor. Quais são as suas referências e quando elas entraram em sua vida?
MATHEUS FERNANDO – Quando eu penso nas pessoas que mais me influenciam/influenciaram, a primeira pessoa que vem em minha mente é a querida Clarice Lispector. E o adjetivo “querida” é de uso exclusivo para os mais íntimos, claro. A forma como Clarice escreve, toda sua introspecção foi um ponto de partida, não para minha escrita apenas, mas para o que hoje considero ter sido um mergulho dentro de mim mesmo, já na adolescência – ali por volta dos 15 anos de idade. Logo em seguida vieram a filosofia, os livros de Friederich Nietzche seguido do grande Fernando Pessoa. A companhia dos rapazes já me veio por ali no início da graduação também.
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REVISTA THE BARD – Ser um leitor/escritor/psicólogo certamente afina seu olhar para qualquer texto. Como isso acontece?
MATHEUS FERNANDO -Sim. Eu vejo que a psicologia veio como a cereja do bolo nessa tríade que você trouxe na pergunta. Ter acesso à experiência humana nesse ambiente terapêutico que é a clínica, mas não só a clínica, o próprio curso de psicologia foi um grande atravessamento na minha vida. Eu reconheço isso, sobretudo por conta da própria escrita. Eu tenho alguns diários enquanto graduando, vários textos e escritos dessa época. O curso de psicologia para mim, simboliza o que Nietsche fala da própria cultura quando ele diz que “o homem estabeleceu um mundo próprio ao lado do outro, um lugar que ele considerou firme o bastante para, a partir dele, tirar dos eixos o mundo restante e se tornar seu senhor” (Nietzsche, 2000, p. 13).
É como se a psicologia tivesse abalado os “alicerces do meu mundo”, de crenças, de preconceitos (ou conceitos prévios) e por aí vai. Geralmente, no senso comum o nosso olhar é meio “viciado” sabe? Viciado no sentido que a gente enxerga o que quer ver. E não tem como apartar isso do que para nós já é identitário, fixo e que na verdade tem muito mais a ver com a pessoa que olha do que com o objeto e ou, o evento olhado. Se esquivar desse olhar “viciado” que fala muito mais de mim do que do que eu vejo, sobretudo em relação a um texto me aproxima da forma mais experiencial possível deste, sendo essa a principal marca da psicologia nesse sentido. A escrita, a leitura vão me fazer esse mesmo movimento, que parece ser um pouco do movimento que é estar numa pequena canoa, a deriva, em alto mar, sem ter o mínimo controle do que vai, do que pode acontecer. É um pouco dessa vulnerabilidade e desprendimento que eu também estou falando.
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REVISTA THE BARD – Mesmo não tendo um livro publicado, você é um escritor. Como foi/é sua relação com esse título?
MATHEUS FERNANDO – Eu vejo e interajo com o título de uma forma bem dessacralizada. Eu vejo, a partir do feedback das pessoas, por vezes uma certa áurea em torno do “nossa, fulano é escritor.” Para gente que escreve, ou pelo menos para mim, se trata de algo comum, rotineiro e árduo como qualquer outro trabalho que tem seus momentos de oásis e seus momentos de gastura. Acho que, assim como a leitura deveria ser algo comum dentro de uma casa, livros por toda parte, e comum à rotina de todos, a intensiva do querer se aventurar a pelo menos tentar escrever algo, também deveria. Faz parte da minha rotina, assim como todos os dias eu almoço, trabalho, faço uns exercícios, durmo … sempre paro uns 30 minutinhos, às vezes mais, para escrever, esboçar algumas ideias. Por vezes são 10 rascunhos, 10 textos jogados fora até que um parágrafo vira a premissa de uma crônica, de um conto. Na mesma medida em que na primeira intensiva dos primeiros 5 minutos pode sair uma poesia inteira, da mesma forma que há dias em que não sai nada. A questão é que eu sempre volto no dia seguinte. Por me relacionar assim com a escrita, de uma maneira bem comum, o título de escritor cabe ao escritor, ou pelo menos me cabe a título de exercício diário, tentante, não como identidade ou patente.
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REVISTA THE BARD – Você escreve crônicas e poemas. Em sua perspectiva, em qual dos gêneros você flui melhor? Por quê?
MATHEUS FERNANDO – Acho que são fases. Eu comecei escrevendo poesia. E nessa época tudo era passível de virar um poemeto. Quando a crônica chegou, foi meio que uma libertação, sabe? Algumas coisas que eu não conseguia fazer com tanta liberdade na poesia encontrou casa nas crônicas. Não que eu não possa fazer com as poesias, mas eu tenho mais facilidade de contar histórias por meio da crônica – como esta, por exemplo, “Meu maior fetiche.” A poesia sempre será a menina dos meus olhos, ela tem um lugar especial dentro de mim, mas crônica, hoje, é o gênero no qual eu fluo mais, até porque me permite ser um pouco mais “vagabundo” por meio de seu uso.
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REVISTA THE BARD – Sei que você tem um livro na gaveta, quando ele saltará para nossas mãos?
MATHEUS FERNANDO – Então jovem, essa é uma pergunta que não quer calar. Por conta desse caos que foi término da graduação/início da minha clínica particular, eu acabei postergando um pouquinho o lançamento desse primeiro livro. Mas no segundo semestre de 2023 o meu primeiro filho vem ao mundo. Aguardem!
Por FLÁVIA JOSS