A vida através da janela
Debruçada na almofada de cetim, gasta pelo tempo, lá estava Dona Jandira em sua janela azul no segundo andar de onde contemplava do ponto mais alto da rua, além das árvores, o pequeno movimento de pessoas com suas sacolas de compras. Logo que alguém parava para descansar, já surgia uma companhia, que nos diálogos e gestos transportavam Dona Jandira para um mundo idealizado, que logo se desmanchava ao se despedirem. Nos arquivos da Subprefeitura é possível conhecer a Rua do Sol Nascente que em outras décadas era bem movimentada. Hoje é uma” rua de passagem”, com casas abandonadas, mas com a arquitetura preservada. Dona Jandira, por insistência, ou esperança de presenciar o progresso daquele logradouro, resolveu por ali ficar…
A vida seguia normalmente e até indiferente à vontade de Dona Jandira, que tinha o poder de transformar e fazer tudo fluir como poesia.
Mas uma mudança brusca ocorreria naquele pequeno paraíso. Não houve nesse dia o sobe e desce dos transeuntes. Tudo ficou estático todos se juntaram. diante da janela, que nesse dia não se abriu aliás nunca mais se abriu. Dona Jandira não interpretaria mais os gestos, nem teria o conforto de ema companhia que nunca lhe fora prometido, mas que perpetuaria numa busca em outros planos. O que restava agora era cultivar a esperança de encontrar entre aqueles alheios se res um narrador que desse um nobre destino à essa história, agora vista por outro ângulo. A visão dos que se encontravam aprisionados, mesmo que ainda pelo lado de fora da janela.
Por ARLINDO VASCONCELOS