Hélio Siqueira é formado em letras pela faculdade de filosofia Santo Thomas de Aquino de Uberaba. Participou de mais de vinte Festivais de Inverno. Possui pós-graduação em Ação Cultural pela ECA/USP (1985) e atualmente é coordenador do MAS – Museu de Arte Sacra de Uberaba. Foi professor de desenho e pintura da UFU de 79 a 90 e nunca abandonou o desenho e a pintura. Reside e trabalha em seu atelier em Uberaba/MG.
ENTREVISTA
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REVISTA THE BARD – Hélio Siqueira quem é?
HÉLIO SIQUEIRA – Nasci no bairro dos Limas, município de Ouro Fino e vivi, neste lugar até os quatorze anos. Lá, como qualquer menino da minha idade de família simples, apendi os rudimentos de uma educação levada a sério pelos meus pais que desejavam, transmitir às crianças, tudo que entendiam por um bom comportamento no sentido de ser alguém na vida. Neste mesmo lugar, através do empenho de meus pais e minhas tias, supertalentosas, transitei pelos caminhos da liberdade e da criação. Na casa de minha avó paterna tinha um curso de corte e costura e ali, dei asas à imaginação criando com tecidos, bordando e fazendo flores. Tudo o que minhas tias faziam eu queria fazer também, apoiado e incentivado por elas. Aos quatorze anos meu pai me levou para ao seminário dos capuchinhos onde tive a chance de dar mais alguns passos na direção que eu sempre queria, ser artista, mesmo que fosse andando por caminhos tortos e inusitados.
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REVISTA THE BARD – Como começou a seu interesse pelas artes e cultura?
HÉLIO SIQUEIRA – Nestes ambientes simples e de costumes enraizados, tudo o que eu precisava saber para alicerçar minhas buscas, estava ali – nestes dois ambientes: a roça e o seminário. Tive chance de me aprofundar mais um pouco com os capuchinhos, porque o Seminário nos dava muitas opções, fosse cantando no coral, fazendo teatro, estudando literatura, bordando paramentos litúrgicos, ou desenhando ou pintando, tudo você tinha liberdade para experimentar. Era um mundo aberto de possibilidades, tanto que você esquecia os rigores de uma vida trancada neste espaço limitado por oração e ladainhas infinitas. Eu gostava.
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REVISTA THE BARD – A Fenomenologia do Espírito de Hegel descreve, a trajetória do espírito em direção à liberdade pessoal e ao autoconhecimento, protagonizando a individualidade. De que maneira essa dialética se aplica em tuas obras?
HÉLIO SIQUEIRA – Não tem como você ser uma coisa e outra na arte. Tudo aparece ao mesmo tempo – junto e misturado. O artista fala do mundo, mas, no fundo, ele se refere a sua aldeia. Aldeia, entendida aqui, como o lugar de suas primeiras vivências. Aquilo que você experimentou nos primeiros anos de vida vai ficar agarrado a seus conhecimentos, tanto assim, que mesmo que você assimile todos os conhecimentos, eles passarão por esse crivo entranhado nas suas primeiras experiências de vida. Na minha obra fica evidente as paisagens e as naturezas mortas dos primeiros anos, o folclore vivido nas folias de reis, a religiosidade e toda cenografia que daí advém.
Artista Hélio Siqueira com a obra Ex Votos ao fundo
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REVISTA THE BARD – A arte e a cultura têm a capacidade de revelar em sua mediação formal um conteúdo histórico e cultural. Como você vê essa composição?
HÉLIO SIQUEIRA – Sempre achei que o artista não pode ficar parado, imóvel no seu canto, reclamando de tudo. O mundo é muito carente de saber e nós, pobres mortais, nos perdemos em coisas banais, sem conseguir deslumbrar com o mundo da cultura. Para você gostar de Cultura não basta ser apenas um diletante, você precisa ser uma pessoa atuante na transformação dos outros. Como você transforma? Colaborando para que outros possam tirar deste mundo lições fundamentais para a vida. Admirar uma obra num museu, por exemplo, não é um ato de simples fluição. Você precisa saber um pouco da vida do artista e sua história, para entrar direto dentro de um quadro. Simplesmente passar na frente de uma pintura, não é saber observá-la e tirar dela lindas lições. Posso dizer que ação cultural é toda forma de atuação que enriquece as vivências de outras pessoas. Seus conhecimentos transmitidos, alavancam o conhecimento de outros. É muito bom fazer isso.
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REVISTA THE BARD – A cerâmica é um processo transformador entre a argila e o fogo. Como tais relações, se estabelecem em posições de afirmação ou negação na sociedade?
HÉLIO SIQUEIRA – Considero a cerâmica a técnica mais difícil de dominar. Trabalhar com o barro, não basta saber emendar um pedaço com o outro. É preciso muito mais. Se você toma um pedaço de barro na mão e se não tiver estudo preparatório de desenho e forma, seu trabalho poderá virar uma coisa muito pequena. A cerâmica exige muito estudo e muito desmanche de peças. Nos ateliers dos ceramistas consagrados, existem monturos de experiências que não deram certo. Com o tempo mínimo que temos, só um artista consciente terá coragem de jogar trabalho fora. É sempre um risco. Nas minhas peças, é o risco que conta. Faço dos meus erros grandes acertos. Os escombros são os mais expressivos. Neste caso o fogo e as labaredas contam muito para a sagração das obras. Como disse meu querido professor Amilcar de Castro, de 10 obras feitas, só uma que conta.
PIETÁ 40x36x26 Cerâmica de baixa temperatura
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REVISTA THE BARD – Você já apresentou várias exposições individuais e coletivas. Conte-nos como foram essas experiências?
HÉLIO SIQUEIRA – Uma exposição é um acontecimento. Muitas vezes ela é importante para você concluir um círculo, uma série e depois começar a estudar e partir pra outra tudo de novo. Fiz muitas exposições na minha vida, até mais do que posso imaginar, não sei como encontrei tanto tempo tendo que me dividir entre a sala de aula e o atelier – vivendo numa cidade do interior onde as dificuldades de um artista se agigantam. Aqui, meu trabalho é muito cerceado, mas fora, consigo um apoio unânime. Sempre que exponho fora, encontro forças para voltar ao atelier e começar tudo de novo. O artista se assemelha a um Sísifo. Carrega a pedra, mas quando ele chega ao topo do monte, vê a pedra rolar ladeira abaixo. Nunca penso que estou pronto. Sou inquieto sempre.
IGREJA DE SANTA RITA óleo sobre tela 50X60 cm
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REVISTA THE BARD – Deixe uma mensagem para os leitores da coluna Nau Literária- Revista The Bard.
HÉLIO SIQUEIRA – A arte requer muita dedicação. Aqueles que pensarem que pintando um quadro vão colher dividendos imediatamente, não sabem em que cumbuca estão se metendo. É importante não desmerecer os conhecimentos do público. No reboliço desse turbilhão de gente, existem muitas pessoas preparadas e tudo isso pode ser demostrado no seu trabalho. Acredito, nesse caso, que uma exposição leva a outras e as coisas vão acontecendo quase que por acaso. Caro artista que está só começando, leve seu trabalho a sério e as portas se abrirão. Muitas portas se abrirão.
AUTORETRATO COM BIGODE VERDE Pintura a óleo sobre tela 22×22 cm
O artista fala do mundo, mas, no fundo, ele se refere a sua aldeia
(Hélio Siqueira)
Por MAGNA ASPÁSIA