Respiro no ar
o cheiro das frutas estragadas
e o vapor dos suores transpirados
por corpos remotos e findados
(O roçar dos segundos assanham os cabelos)
O oxigênio que inalo
vem do exalar de narinas passadas
reciclado pela clorofila imóvel das gramas
e do sombrear verde das árvores
que protegem o escaldar dos minutos consumidos
que os dias levam no chegar das novas madrugadas
(A luminosidade das manhãs
apaga o negrume das noites
no voltar das sombras
que me acompanham o dia)
No caducar das casas e dos telhados
que margeiam o caminhar nas calçadas
a existência atravessa as ruas da vida
como um transeunte disperso, alheio e distraído
que fora da faixa dos pedestres não olha semáforos
indiferente aos perigos dos carros e dos assaltos
(O oxidar dos ferros
é a memória dos pregos)
Enquanto caminho sem espelhos ao lado
persigo coelhos brancos imaginários
como se estivesse no adiantado das horas
embora esteja sempre atrasado, atrasado
(Nenhum relógio me diz
o que acontece com as horas
depois que elas passam)
Quando estiver cansado e sentado à beira
vou me enfiar na primeira toca que encontrar
e ir para o outro lado do lado de cá
fertilizar o chão do amanhã
alimentando à seiva das árvores
e ventilar o ar inalante das crianças vindouras
Por JOAQUIM CESÁRIO DE MELLO
Recife – Pernambuco, Brasil