A intertextualidade que ocorre na prosa quando se faz poesia é subliminar: se faz evidente somente se o seu autor assim desejar. Ainda hoje há quem defina muitas das prosas poéticas de Clarice Lispector como crônicas, e esse erro é costumeiro, infelizmente.
Conforme venho dito nesta coluna deveras necessária: para se conceber uma prosa poética, é importante tracejar a sua feitura e delimitar quais lacunas serão preenchidas pelo belo intrincado na poesia.
Escrever com mestria quaisquer gêneros literários requer muita prática, e com a prosa poética não é diferente. Deseja construir um texto que por si só já se defina? Pois bem, rascunhar é necessário. Ler e reler diversas vezes, também. Nunca esqueça de enriquecer a sua produção com figuras de linguagens, afinal, poemas sempre estão repletos delas. Não pare por aí, é preciso convencer o seu leitor do seguinte: o seu texto traz uma mensagem importantíssima que carece de ser desvendada, mas não antes de ser sentida.
É cautela que falta à mão que segura a caneta e dá vida ao gênero textual paradoxal Prosa Poética. Leu atentamente os indicativos acima? É sensível e provido de imaginação?
Ora! Está esperando o quê para dar início à sua produção?!
Um momento de desânimo
Clarice Lispector
Em algum ponto deve estar havendo um erro: é que ao escrever, por mais que me expresse, tenho a sensação de nunca na verdade ter-me expressado. A tal ponto isso me desola que me parece, agora, ter passado a me concentrar mais em querer me expressar do que na expressão ela mesma. Sei que é uma mania muito passageira. Mas, de qualquer forma, tentarei o seguinte: uma espécie de silêncio. Mesmo continuando a escrever, usarei o silêncio. E, se houver o que se chama de expressão, que se exale do que sou. Não vai mais ser: “Eu me exprimo, logo sou.” Será: “Eu sou; logo sou.”
Por JEANE TERTULIANO