Conto de filmes

Conto de filmes

 Na minha infância os Natais tinham neve, perus enormes, pinheiros de verdade e o Papai Noel voava em um trenó puxado por renas.

 Pelo menos em todos os filmes que assistia na sessão da tarde nos meses de dezembro.

 Porém a realidade era bem outra, a minha neve era a areia da praia, o nosso peru desnutrido parecia mais um frango e o pinheiro eram os coqueiros decorados com luzes coloridas. Até a nossa árvore de Natal parecia do espaço, era prateada. Nem a forma era de pinheiro, parecia mais um guarda-chuva carnavalesco.

 O Papai Noel eu nunca vi, ficava horas acordada para flagrar o bom velhinho, mas ele era bem mais esperto que eu.

 Deixei um pratinho com biscoitos creme-craque na expectativa do Papai Noel esquecer do tempo, saboreando na madrugada alguns biscoitos.

 Mas cheguei a conclusão que depois de comer tanto biscoito amanteigado e fresco do forno nos Natais americanos, o Papai Noel jamais perderia tempo com os meus biscoitos secos.

 Mesmo assim, o bom velhinho me trazia presentes. Nem sempre recebi o que pedi, mas sempre encontrei um presentinho no sapato lustrado.

 Um dia os meus pais me confessaram que não existia Papai Noel, eu teria que me contentar com um presente só. Nos filmes, o Papai Noel continuava esbanjando banha e brinquedos. Só recebia presentes, quem acreditasse nele.

 Eu queria continuar acreditando, mas ele já não me trazia nada. Acho que desacreditou de mim. O tempo passou, eu cresci. Meus Natais já não tinham a mesma empolgação do passado. Era mais uma festa de comes e bebes, com presentes trocados.

 Depois de adulta, eu vim parar na Alemanha em um mês de junho. Os meses foram passando e quando a festa de Halloween também passou, todos os monstros e bruxas foram substituídos por decoração natalina.

 De repente em todas as esquinas as luzes brilhavam. Os mercados exibiam um mundo de chocolates e biscoitos natalinos.

 Os pinheiros eram verdadeiros, verdes, espinhudos.

 Até o ar frio tinha cheiro de Natal, chaminé, canela, guloseimas, vinho quente e pinho.

 No meu jardim apareceu uma rena, se escondeu no meio dos arbustos e se assustou quando me viu. Será que o bom velhinho estava me observando? Voltara a acreditar em quem nunca perdeu a esperança de reencontrá-lo?

 Eu estava vivendo o Natal dos meus filmes…até chegar o Natal.

 No dia vinte e quatro eu estava praticamente só. Somente meu namorado de outrora e eu sentados em uma mesa farta, em um apartamento decorado como os filmes americanos.

 Pinheiro de verdade, peru recheado, presentes desejados, neve do lado de fora, mas saudade dolorosa no coração.

 Minha família estava do outro lado do mundo, festejando um Natal tropical, sem renas nem neve, sem pinheiros e perus.

 Eu tinha tudo o que desejei de todos os filmes, porém o essencial me faltava, a minha família.

 Jesus quando nasceu, só tinha sua família festejando esse momento. Não havia nenhum Papai Noel acima do peso, nem renas voadoras.

 A única luz que iluminava eram as estrelas. Se tinha algum peru na história, não foi devorado, era visita.

 Nesse Natal de filmes encantados, eu descobri que a verdadeira magia do Natal, não é o cenário deslumbrante e sim o elenco da história.

 O meu Natal seria perfeito até em uma choupana, se a minha família estivesse presente como único e mais precioso presente.

 Anos mais tarde, quando os meus filhos nasceram, toda a alegria de festejar o verdadeiro Natal voltou em forma de amor, não o de filmes, mas amor de verdade, de pele, osso, carne e muito coração.

 Um Feliz Natal a todos!

 Feliz 2022.

Por SHEILA STILLER

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