CONTOS – A comitiva por Luís Amorim

CONTOS – A comitiva por Luís Amorim

A caminhada fora longa e extenuante, cansado encontrando-se e muito, mas finalmente preparado para o ansiado destino o receber. Fazendo uma enorme fé nas indicações trazidas de fonte segura, ali mesmo seria o final de uma jornada onde para início de um merecido descanso, um copo de água seria realmente bem-vindo. Estava então à porta e mais do que pronto para entrar mas segundo as notas que o acompanhavam, teria de esperar pela comitiva. Não poderia entrar sem ela, haveria que fazê-lo na companhia da mesma sem outra opção tida por aceite. Virou-se para trás mas não havia sinais dela. O relógio foi chamado à sua presença mas apenas para lhe dizer que a comitiva encontrava-se atrasada. Pensou no que fazer, se iria realmente esperar ou entrar mesmo. Mas ao olhar para além da entrada de porta aberta, percebeu que tal não iria ser considerado sequer possibilidade viável pois os que estavm lá dentro, parecendo adivinhar-lhe o pensamento, fizeram de imediato cara feia, reprovando tal pretensão. Percebeu que entrar sozinho não poderia ser, pelo que ao fitar o horizonte que estava distante, esperava sentir o alívio de ver a comitiva aproximar-se.

Mas tal ainda não era motivo para o acalmar. Voltou a solicitar o parecer do relógio, pensou que este adiantado estaria, o que não agradou ao mesmo, sentindo-se despeitado. Por isso regressou ao seu bolso na agitação de quem o supôs ineficiente e tolerante nada perante quaisquer atrasos. A comitiva vinha em caminho tardio, faltava saber em que ponto do percurso enquanto o seu lugar seria ficar ali especado, sentindo-se fitado à porta pelos que se encontravam lá dentro, aguardando com manifesta impaciência por quem estaria no trajecto mas ainda não na sua final recta. De quem mais se esperava não havia no então de horário solicitado qualquer vislumbre que cumprimentasse o mais desejado momento de quem precisava dela para finalmente entrar. Ouviu um som ao longe, encheu-se de esperança ao pensar ser ela mas tão depressa como veio também o som pareceu rapidamente extinguir-se. Talvez fosse uma sonora ilusão da sua parte, porque da mais desejada nem som nem visão. Só lhe faltava começar a ver cenários ilusórios na figura de comitiva para colmatar o evidente desânimo por se encontrar ali à porta sem poder entrar. Os que lá dentro mandavam pareciam impiedosos nessa inflexibilidade de forçá-lo a esperar. E ainda com mais crueldade se revelavam na feieza, assim mesmo pensado a tal e qual gente feia por certeza que seus rostos evidenciavam, obviamente por se aperceberem do que havia sido pensado à porta, no desesperando pela chegada da comitiva. Desta, ainda nada em novidade para acrescentar visto o seu atraso ser já no então de ocasião significativo, o que levava a conjecturar problema qualquer ocorrido durante o percurso. Ou então, a não comparência a horas e minutos certos, dever-se-ia a um propósito que o directamente visava. Estava pois, a desculpas inventar para justificar o estar defronte a uma porta, esperando por quem nunca mais parecia chegar. Pensou que talvez se desse sinal da comitiva quase a surgir pelo sorridente horizonte, os lá de dentro poderiam facilitar-lhe a entrada, qual enganados por si ficariam por justa ignorância. Sim, porque seria uma forma de os ludibriar com boas pretensões, as suas, para em alívio, poder entrar. E assim foi. Começou a gesticular que a comitiva já vinha pelo horizonte, crescendo a olhos vistos mas tal não surtiu efeito, pois os que estavam lá dentro não se deixaram enganar, fazendo inclusive caras mais feias do que no antes, reprovando desse modo a tentativa de serem eles enganados. Até lhe pareceu que encheram-se os referidos de ar para ficarem maiores, de peito feito, barrando ainda por inacessível adicional o espaço que era pequeno, à entrada pelo menos, pois que lá no interior seria bem espaçoso, assim por natural ele acreditava. Também por convicção tinha que não deveria ficar sozinho por muito mais, dado o atraso que então se verificava. Mas seu desespero manifestava-se, uma vez que desejava bastante dar entrada mesmo que sozinho. Tanta opção lhe passou na mente sobre o que fazer e se conseguisse desaparecer por instantes, poderia tentar dar seu acesso por outro lado, alguma janela de eventual acolhedora recepção e, uma vez pelo espaço contrário ao exterior, certamente que não o iriam expulsar. Olhou em redor e percebeu que seus movimentos eram controlados ao pormenor, ou seja, sair dali e tentar ludibriá-los vez segunda, não teria margem para acontecer. Haveria que esperar mas com imenso tempo decorrido, sua tez já desesperava por boas novas em som que nunca mais lhe chegava. E quando em tom musical ele sentia, rapidamente concluía ser ilusão de quem espera imenso pelo acontecimento que se realize e tal não sucede. Começava a duvidar que este em concreto pudesse ter um desenlace favorável, uma vez que o atraso era substancial e de comparência ao longe nem sinal que lhe assegurasse que iria entrar, naturalmente bem acompanhado, ainda que o mais pretendido era, sem qualquer dúvida, passar lá para dentro. Veio-lhe à ideia que isso nunca iria ter verídica pose e na consequência directa, ensaiou uma de fuga atitude, de virar costas e desaparecer, naturalmente dali para qualquer outro lugar. Mas as mesmas caras feias manifestaram-se novamente, repudiando sua eventual deserção. Teria de aguardar pelo desfecho e a chegada de quem estava no atraso justificado ou não, pormenor este não interessava. E convinha por obrigação decretada no manter-se bem desperto, sem ceder a cansaço ou intenção de pontual dormitar, o que manifestamente começava a ter o seu ânimo e em força. Tentativa de o acolherem devido a sono ou cansativo estado desanimado e tanto não surtiu o efeito pretendido. E já nem lhe ocorria que adicional investida, fosse ela qualquer pensada de improviso ou previamente estudada, desse o resultado mais ansiado: entrar lá dentro. Os olhares reprovadores diziam-lhe que teria de esperar. Mas ele possuía na ocasião ideias outras: virar costas e ir embora.

Nem pensar em tal! Os feios olhares reprovaram no imediato essa pretensão, indicando o sítio onde teria de se manter: ali mesmo até chegar ela por figura incontornável, finalmente perspectivada no horizonte. Todos ficaram radiantes pois que a comitiva era já visível. Os brindes tilintavam mas apenas para alguns que ele, cá fora, ainda não poderia usufruir desse direito. Haveria que aguardar. Mas então na altura festiva para uns quantos apenas, o semblante de si próprio era também de alegria quanto baste, talvez de um alívio em satisfação pois que já não era sem tempo, iria entrar.

Bastava um pouco mais que a comitiva estaria quase a chegar. Só momentos em pausa, alguns mais, e cada vez maior era aos olhos bem menos cansados do que antes. Lá dentro, todos se compunham para a triunfal recepção, distante cada vez menos e no breve a dar final aproximação. A espera quase era uma religiosa pausa em reverência perante o cortejo, no agora de então, finalmente chegando. Ele tentou que o deixassem entrar mas nem pensar, isto mesmo foi-lhe visualmente transmitido. Antes disso, vénias para a comitiva e em particular nos representantes pela frente do cortejo que deram entrada lentamente pois que a largura de acesso era bem menor para a correspondente pretendida, bem mais larga durante o percurso anterior. Boa parte já havia acedido quando ele tentou que lhe dessem passagem mas resposta visual foi interpretada como negativa óbvia, que teria de se esperar pelo fim. E a comitiva nunca mais parecia ter um concluir de jornada. Se acesso ao interior só lhe fosse permitido assim que tudo entrasse talvez houvesse que aguardar imenso tempo. Então olhou para o horizonte, esperançado em ver extremidade como parte final à sua evidente satisfação, mas não, a comitiva realmente parecia não ter fim.

Por LUÍS AMORIM

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