Em meio à multidão, senti que alguém me cumprimentou. Não há espaço à dúvida, foi comigo. Olhei à minha proximidade, e não havia ninguém em condições de receber tal atenção.
Não me acusem de ser impressionável. Nada disso, trabalho no mais cruel dos mundos, o das finanças. Já vi tombos de empresas centenárias e investidores famosíssimos perderem tudo em poucas horas. Sou calejado e nada mais consegue me impressionar.
Quem é essa pessoa que me cumprimentou? A minha vista não é a mesma de algum tempo atrás. Para eu poder ver com nitidez quem reparou em mim, seria preciso ao menos um binóculo – elemento que não anda comigo todo o tempo.
O que eu fiz para merecer essa atenção? A pergunta remete a algo ainda mais básico: poderia eu merecer alguma atenção? Quem seria a pessoa a conceder qualquer centelha de atenção a mim?
São tantas as incertezas que resolvi ir à busca de respostas da maneira mais direta possível: corri atrás daquele belo sorriso, distribuindo cotoveladas e tentando sussurra pedidos de desculpas em meio à multidão que nos separava.
Afinal, consegui chegar perto daquele olhar. Por sorte, estava de costas. Apenas nesse momento, percebi o quanto estava sendo ingênuo e até mesmo inoportuno; o que diria eu? A abordagem direta jamais poderia funcionar, seria simplesmente impossível dizer: você estava olhando para mim, quem é você e quais são as suas intenções?
Fiquei paralisado e sem jeito, como criança apanhada em flagrante ao atacar o pote de doces da avó. E se ela se virasse em minha direção agora? O que eu diria? Seria terrível disfarçar assobiando. Tomei coragem, tossi para atrair a atenção dela – que se virou em minha direção. Que vertigem! De perto vi que a beleza feminina se personificara à minha frente e que a ousadia daquela corrida havia valido a pena.
Ela riu, por ter percebido o fascínio e domínio exercido sobre a minha pobre insignificância. Resolvi dizer diretamente que poderia estar enganado, mas que ela estivera olhando para minha direção.
Com o olhar mais cândido do universo, respondeu que havia feito contato com a rede social dos meus colegas de classe, uma turma lá do final dos anos 1990, tendo encontrado links para fotos recentes, nas quais me reconhecera. Enfim, descobri o motivo: eu estava diante de uma stalker! Ainda sem jeito, perguntei se havíamos estudado juntos. Ela disfarçou e disse que sim. Eu não estava conseguindo reconhecer a dona daquele sorriso e pedi ajuda.
Ela percebeu a minha dúvida e brincou com ela. Quer dizer, brincou comigo, dono da dúvida:
— Como você não me reconhece! Mas que absurdo!
Demorou, mas consegui articular uma resposta:
— Você está tão incrível que até parece de outro mundo! Não quero e nem preciso conectar ao passado!
— Gostei de ver! Você mudou, não é o mesmo de antes, que apenas pensava em estudar e não dava atenção às pessoas!
— Que bom que você percebeu! Pode ficar sabendo que a mudança foi toda por sua causa!
Por ROBERTO MINADEO