Passava das 11 horas da manhã de sábado e precisava escrever um artigo para a revista Locks e Mod, uma revista de pouca tiragem e muita juventude crítica.
Mesmo me pagando pouco, ainda era algo no bolso e, na minha situação, o pouco é muito. Giovana terminará comigo na tarde anterior num encontro repentino após umas duas ligações insistentes para que nos encontrássemos, fomos a um barzinho próximo ao apartamento que ela dividia com amigas da faculdade de arquitetura. Numa mesa de madeira vagabunda, que diga-se de passagem mais rangia do que sustentava-se em pé e havia tantos rabiscos nela que parecia uma obra de arte de uma criança de 6 anos, mas isso não importa, ali, naquele bar, naquela mesa, ela me disse:
“Acho que é hora de darmos um tempo.”
Ouvir aquilo bebendo uma cerveja barata deixou um gosto mais amargo do que eu esperava. A verdade é que já imaginava que o tema seria nossa relação, ela já estava fria e distante, dizia que a origem dessa mudança de temperatura era eu, porém sabíamos que não era apenas eu, mas ambos. Busquei ar pra encher os pulmões pra tentar pronunciar qualquer sentença, qualquer uma que ao menos demonstrasse um espírito de luta ou esperança ante aquela situação. E consegui.
Disse miseravelmente e quase sem forças:
“Tudo Bem.”
Olhei nos olhos dela por uns segundos antes de virar a lata da cerveja como se morresse de sede, depois apenas olhei pra baixo por mais um tempo até que ela quebra o silencio, com uma frase que definiu pra sempre qual caminho seguiríamos:
“É tudo que você tem a dizer?”
Respirei fundo, e agora com os pulmões descomprimidos de nervosismo, soltei um belo, sonoro e indiferente “É”. Depois disso apenas levantei e fui embora, nem sequer prestei atenção em como cheguei em casa, qual tipo de condução peguei. Apenas estava lá, em minha cama, olhando para o teto e me fazendo perguntas que algumas pessoas, creio eu, não teriam em minha situação:
“Por que não estou triste?”
“Por que me sinto aliviado?”
“Por que não sinto falta dela?”
“Por que me sinto vazio?”
Apesar de passar umas horas pensando nisso, não encontrei resposta, só sono e tédio. Claro, isso me fez dormir depois de um tempo e ainda bem, pois precisava escrever um artigo no dia seguinte. E aqui estou eu, pensando um pouco sobre aquela situação com pitadas de covardia, frieza e vergonha da noite anterior.
Dei uma golada no café quente e uma tragada demorada no cigarro. Tinha parado, por conta dela, mas ela se foi, então… tanto faz. Depois de um tempo pensando sobre o que escrever, decidi sobre o que gostaria de falar. Algo que trouxe alivio, mas trouxe incômodo. Algo que trouxe ordem, mas trouxe vazio. Algo que trouxe satisfação, mas saudades.
20 de agosto de 1983, Rio Grande do Sul
Nascimento de Estrelas no Vácuo do Amor.
Quando pensamos em uma relação amorosa, vemos ela como algo que vem e traz a ordem para a vida das pessoas. Ela resolve a solidão. Ela resolve o propósito, afinal, você no mínimo terá com o que se importar quando acordar pela amanhã.
Ela mostra soluções para problemas. Ela oferece a mão amiga. Mas não é só isso, quando pensamos em relações e traçamos um paralelo com a Entropia, podemos na verdade dizer que relações começam organizadas, mas o tempo as torna desorganizadas, as faz gerar caos. O que era pra resolver solidão, na verdade mostra uma nova faceta dela. O que era pra trazer o propósito, o ofusca, pondo em perspectiva sempre o outro. Se você não souber controlar a si mesmo e sua mente.
O que era para solucionar problemas, cria novos, mas o que na vida não faz isso, não é mesmo? E claro, todavia, a mão que era pra ajudar, na realidade, é a mão que muitas vezes enfia a faca nas costas. Tudo vai se deteriorando, se desorganizando, se destruindo. E quando se vê, está apenas você, sozinho num vácuo gigantesco deixado por apenas um sentimento, isso mesmo, apenas um. E sozinho você precisa responder uma pergunta, a última, como definiu brilhantemente Isaac Asimov:
“Como reverter a Entropia?”
Essa frase pode ser lida da forma que quiser, como por exemplo:
“Como sair da solidão?”
“Como manter meu relacionamento?”
“Como realizar meu sonho?”
No fim, é uma luta sua contra o fato, o destino e o tempo. E resposta pra resolver esse problema? bom, para alguns, incluso Asimov, será:
“Que se faça a luz!”
E varias estrelas irão surgir em seu vazio, sua coragem, sua força de vontade, sua indomável rebeldia ou fé.
Talvez isso vença esses inexoráveis rivais, talvez isso os torne fortes. No fim, importa apenas qual será a forma que você usará pra preencher o vácuo do amor com brilhantes estrelas.
Por PAULO DE BRITO