Agora que sou a soma das minhas idades, estou velho, segundo o corpo, o INSS e os calendários.
Recentemente meu genro gentilmente carregou o peso de minhas malas que estavam no carro. E no aeroporto já posso entrar no portão de embarque, onde tem uma placa com o desenho de um homem encurvado se apoiando em uma bengala. Chamarem-me de senhor, então, já estou acostumado.
Não sei como se morre de velhice, nunca, antes, morri para saber. Só sei que tenho agora mais aniversários que a anti-velhice dos meus pais, que se foram mais cedo, um me deixando menino e outro me deixando rapaz.
Dizem que há velhos que somente vivem de passado. Não deve ser este meu caso, pois não estou a viver de ontens, são os ontens que estão vivendo dentro de mim. Meus passados jamais passaram, pelo contrário, eles ficaram se acumulando no interior da minha história, no inchar da memória e corroendo meu presente com a fome gulosa de chegar no depois do amanhã que se esconde no amanhã do futuro que vem depois de hoje.
Nenhuma vez nasci velho. Jamais convivi com pais velhos. Todos meus velhos já desapareceram na velhice dos velhos. Até minha velha casa da infância foi derrubada e nem sei o que fizerem com os tijolos dela. Por isso, meus queridos jovens, de velhice não entendo nada e, creio, vou lá na frente mirrar, murchar e sumir sem saber o que danado quer dizer isso.
É claro que meu corpo, como todo corpo, enruga, definha, agrisalha, caduca e se desgasta, porém minha alma não, ela em tempo algum envelhece, ela apenas e somente cresce, aprende, amplia, aprofunda e amadurece. Velhice é coisa da carne, dos ossos, da matéria e da biologia.
Quando era criança e rapazote calculava minha idade quando o ano 2000 chegasse. Parecia que eu seria mais velho que a eternidade. Achava que os velhos eram sempre anacrônicos, retrógrados e reacionários. Pode até ser para uma certa maioria de velhos, porém trago em mim o espírito rebelde, incomodado, progressista e arrojado, com algumas leves pitadas de sabor revolucionário.
Que me desculpem a carteira de identidade e meus aniversários, mas não sou velho, apenas estou tão somente simplesmente velho, afinal ainda continuo a desbravar o mundo e exploro a vida com os dentes que me restaram…
Por JOAQUIM CESÁRIO DE MELLO