A estrada fluía. Terreno escorregadio de latossolo amarelo jazia sob o verde degradado por pastos e culturas agrícolas, encoberto por um céu azul entre o lusco-fusco e as primeiras estrelas. O carro rodopiou no terreno íngreme. Paramos à beira de um precipício, ao grito de “Ai, meu Deus” dito por quem estava no volante.
Alguns trechos, cortados por banhados, formações pioneiras sobre solos incipientes, assoreadas por pisoteio de gado e erosão. Parávamos às vezes, para verificar a profundidade da água e nos certificar de que o carro teria como passar, mesmo não havendo outro caminho que não aquele, que percorríamos sem noção de tempo e conexão com o mundo.
O carro derrapava a todo o momento. O latossolo amarelo nos perseguia, trazendo certa angústia, que se sobressaía às outras emoções e dominava a paisagem noturna.
Por vezes, desviava o foco e avistava os cultivos de subsistência dos assentamentos dos sem-terra, tribos indígenas ou quilombolas — um picadeiro ainda não encoberto, em entorno do Parque do Descobrimento.
Persiste na região, formando um corredor de biodiversidade em todo o litoral brasileiro, do extremo norte ao sul. Manto verde contínuo. Conta um pouco do que sabemos através dos registros de Spix, Martius e Hulboldt sobre a natureza do “Novo Mundo”. Encontram-se ali árvores com grandes diâmetros, difíceis de serem vistas. Local de origem do Pau-Brasil, madeira de lei e símbolo exploratório de desenvolvimento. A degradação se faz pelas bordas, na política da boa vizinhança, no ruído de motosserras misturado ao barulho da fauna, da flora e do vento nas folhas.
Eu só queria percorrer tudo aquilo, tocar as montanhas invioláveis do País, nas rochas escorregadias, que não permitem grampos, garras ou que alguém as escale. Íntegras.
Por JOEMA CARVALHO