“Os Engenheiros do Caos”, de Giuliano Da Empoli
Ano de eleição! Sem discussões políticas, é válido estar atento ao quanto o mundo mudou no que diz respeito a tecnologia nos últimos tempos e como isso pode impactar nossas decisões, inclusive o voto. Em Os Engenheiros do Caos, da Editora Vestígio, Giuliano Da Empoli fala sobre como cada vez mais o improvável vence as eleições e por quê.
O livro é dividido em seis capítulos: o vale do silício do populismo, a Netflix da política, Waldo conquista o planeta, Troll – o chefe, um estranho casal em Budapeste, e os físicos e os dados. O autor começa falando sobre o Carnaval como festa popular e como as pessoas deixam de ser elas mesmas nesse período de festa, se fantasiando do que mais convêm. O que vem acontecendo é que, onde quer que seja, na Europa ou em outros continentes, o crescimento do populismo tomou a forma de uma dança frenética que atropela e vira ao avesso todas as regras estabelecidas. Os defeitos e vícios dos líderes populistas se transformam, aos olhos dos eleitores, em qualidades, como escreve Da Empoli.
Ainda no capítulo sobre o vale do Silício do populismo, o primeiro do livro, o autor ainda destaca que um elemento fundamental da ideologia do Vale do Silício é a sabedoria das multidões: não confiem nos especialistas, as pessoas comuns sabem mais. Também avalia que cada vez mais as pessoas conectadas são frustradas por acessarem conteúdos que também causam a frustração, como sites pornográficos e conspiratórios.
Claro que as redes sociais e os aplicativos de mensagens têm espaço considerável na obra. Sentimos isso no dia a dia e, cada vez mais, naturalmente, como nas redes sociais, a nova propaganda se alimenta sobretudo de emoções negativas, pois são essas que garantem a maior participação, segundo o autor.
Giuliano chama o celular de “gaiola de bolso”, um instrumento que nos torna rastreáveis e mobilizáveis a todo momento. E sobre o Big Data ressalta: a chegada do Big Data, em termos políticos, poderia ser comparada à invenção do microscópio. E quando muitas vezes nos questionamos por que o Facebook não é mais rígido com a divulgação de informações reais ou Fake News, ele nos lembra que as redes sociais são plataformas publicitárias que colocam à disposição das empresas instrumentos extraordinariamente avançados para chegar aos clientes.
Um recente estudo do MIT – Instituto de Tecnologia de Massachussets – demonstra que a falta de informação tem, em média, 70% a mais de probabilidade de ser compartilhada na internet, pois ela é, geralmente, mais original do que a notícia verdadeira. A verdade consome seis vezes mais tempo que uma Fake News para atingir 1.500 pessoas.
Os engenheiros do caos compreenderam antes dos outros que a raiva era uma fonte de energia colossal, e que era possível explorá-la para realizar qualquer objetivo, a partir do momento que se dominasse a tecnologia.
E, bem lembrado no capítulo Waldo conquista o planeta, as pessoas estão se divertindo ao verem uns serem intolerantes com os outros e ganharem espaço com isso. Para quem não sabe, Waldo é um personagem do episódio Momento Waldo da série Black Mirror, disponível na Netflix. Waldo é um urso azul computadorizado que, com seu sarcasmo escondido atrás de supostas perguntas infantis, entrevista políticos em um programa de TV. Por trás do personagem, está um comediante infeliz. E Waldo faz tanto sucesso escrachando os entrevistados, que acaba sendo convidado a se candidatar (informações retiradas do Wikipedia).
Mais um tópico importante: o autor explica sobre Troll. Na linguagem da internet, designa usuários que disseminam a discórdia, a fúria e o caos nas redes sociais, aleatoriamente ou com estratégias definidas. Ele também indica que o próprio Donald Trump é um troll e a polêmica por ele criada sobre a certidão de nascimento de Barack Obama foi uma forma de trolling.
E, algo que devemos observar é que, segundo o autor, quando os líderes atuais saírem de moda, é pouco provável que os eleitores, acostumados às drogas fortes do nacional-populismo, peçam de novo a camomila dos partidos tradicionais, já que a demanda deve ser cada vez mais por algo ainda mais forte. Ah, lendo ou não o livro, vale pesquisar mais também sobre o Movimento 5 Estrelas e analisar como movimentos como esse podem estar influenciando novas gerações.
Giuliano Da Empoli – Nascido em Paris em 1973, Giuliano Da Empoli dirige o grupo de pesquisa “Volta”, com sede em Milão. Ex-aluno da escola Sciences Po, de Paris, foi secretário de Cultura da cidade de Florença e conselheiro político de Matteo Renzi (ex-primeiro-ministro italiano). Vive na capital francesa.
Sinopse: aos olhos dos seus eleitores, as deficiências dos líderes populistas se transformam em qualidades, sua inexperiência demonstra que não pertence ao círculo da “velha política”, e sua incompetência é uma garantia de autenticidade. As tensões que causam em nível internacional são vistas como mostras de independência, e as fake News, marca inequívoca de sua propaganda, evidenciam sua liberdade de pensamento. No mundo de Donald Trump, Boris Johnson, Matteo Salvini e Jair Bolsonaro, cada dia traz sua própria gafe, sua própria polêmica, seu próprio golpe brilhante. No entanto, por trás das manifestações desenfreadas do carnaval populista, está o trabalho árduo de ideólogos e, cada vez mais, de cientistas e especialistas do Big Data, sem os quais esses líderes nunca teriam chegado ao poder. É o retrato desses engenheiros do caos que Guilherme Da Empoli nos apresenta, por meio de uma investigação ampla e contundente que vai além do caso Cambridge Analytica e remonta ao início dos anos 2000, quando o movimento populista global, hoje em pleno curso, dava seus primeiros passos na Itália. O resultado é uma galeria de personagens variados, quase todos desconhecidos do público em geral, mas que vêm mudando as regras do jogo político e a face das nossas sociedades.
Alguns trechos do livro:
– A política não me interessa, o que me interessa é a opinião pública.
– Uma formiga não deve saber como funciona o formigueiro, do contrário todas as famílias deveriam ocupar os melhores postos e os menos cansativos, criando assim, um problema de coordenação.
– Deixem-me ser o porta-voz da sua ira! Foi com essa mensagem que o candidato mais improvável da história tomou a Casa Branca.
– Um bom político é um sujeito que vai dizer uma série de coisas verdadeiras antes de começar a dizer uma série de coisas falsas, porque assim vocês vão acreditar em tudo o que ele diz, verdades ou mentiras.
Por JANAÍNA LEME