Andou para um lado
andou para o outro
olhou de novo o relógio
e ela não chegou
A tarde se retirava
ensanguentando o céu da cidade
de um vermelho tão avermelhado
como não se via desde
o último entardecer da infância
As ruas se encheram de pessoas
que apressadas saiam das grutas dos prédios
mais velhas de que quando entraram
misturando o fonfonar dos carros
com o rumorejo das bocas inquietas
e o bulício dos sapatos pisoteando calçadas
incomodando as árvores, as pedras e as esquinas
já tanto abarrotadas de gente
Não podendo mais andar para os lados
acomodou suas costas suadas
na coluna cimentada do poste
que preguiçosamente desadormecia
iluminando os fios embranquecidos das esperas
em sua cabeça exausta de minutos
Mais cinco nuvens se passaram
cinquenta e oito ombros se esbarraram
noventa e sete carros andaram
mil oitocentos e um segundos se acumularam
e ela
assim como antes
e anterior ao ontem de antes
novamente mais uma vez não chegou
Para onde ela fora não sabe
nem se mudou de bairro
de Estado ou de cidade
desconhece sequer seu endereço
localização ou paradeiro
mas de uma coisa ele conhece
e jamais esquece
que foi aqui que seus olhos se entrelaçaram
quando eles se cruzaram
naquele final corado de tarde
do agora distante ano passado
Por JOAQUIM CESÁRIO DE MELO
Recife – Pernambuco, Brasil