Imagem de Darksouls1 por Pixabay
“Olhar de meia-noite”. Assim defini os meus devaneios durante as madrugadas insones; momentos em que o sono não vem, mas é tarde para fazer algo mais produtivo.
Tomada sou por um olhar de pensamentos, de forte imaginação e permeado de momentos revividos.
Aquele olhar esperançoso da chegada do sono, sem saber quando ou se o repouso virá; onde eu me concentro para desconcentrar – e não consigo.
Um olhar de lembranças, de expectativas, de receios, de análises, de pensamentos soltos e vagos…
Um olhar de planos a serem colocados em prática e que, muitas vezes, vão embora com o simples cerrar dos olhos.
Flashbacks que vêm e vão até que, sem perceber, adormeço…
E, vagando por um vasto universo de possibilidades, entre estágios intercalados de leve e profundo sono, minha mente ousa recriar devaneios: pensamentos diversos – ora consciente, ora inconscientemente – que variam dos mais simples aos mais insólitos.
Em meio à difusão e ao desprendimento da realidade, com o corpo tomado por involuntária paralisia, as conjecturas da mente anseiam, instintivamente, por liberdade.
A alforria, enfim, manifesta-se; revelada por inevitáveis olhares de meia-noite…
A Menina de Olhos Castanhos
Era uma menina de olhos castanhos – sua descrição pura e simples. Não que tivesse algo a esconder, mas era como se apresentava.
Não queria ter um diferencial. A exaltação de características nada rebuscadas a igualava a várias outras garotas. E era o que ela queria!
Tinha pavor em ser notada, vista ou julgada. Sentia-se reprimida e colocada em uma posição que tinha aversão. Detestava a ideia de existir, mas existia.
A menina que era simplista! Na verdade, aquela que, no âmago, não era nada simplista. Fazia exercícios para manter sua mente vazia de tudo, mas não conseguia.
A menina de olhos castanhos! A menina que se autodenominava assim tendo como único critério a cor dos olhos. Mas… Por que este critério?
Ela, que detinha uma infinidade de características e formas que poderiam descrevê-la, por que escolheu a cor dos olhos?
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Em uma inevitável autoanálise motivada pela ruptura de seus próprios paradigmas, descobriu que era muito mais do que uma menina de olhos castanhos. Percebeu que o seu olhar, aquilo que a caracterizava perante o seu mundo particular em uma percepção de seu alter ego, era rico em significados. Foi quando sentiu, pela primeira vez, um choque de realidade.
Arriscou-se, repentinamente, a ser quem, de fato, era!
Tentar se igualar às outras era demasiado difícil; moralmente complexo. Assentiu que aquela que optava por ser não era ela. Livrou-se das amarras que outrora havia criado para si. Afastou o receio de abranger sua visão e, enfim, passou a enxergar.
Optou por escolhas positivas. Saiu da inércia; da vida sem emoções pela qual havia se acomodado. Sentiu vontade de ir além: até o horizonte que os seus olhos alcançavam.
Passou a trabalhar a sua forma de lidar com aquilo que a rodeava e, mais ainda, com a maneira com a qual se relacionava com seu próprio eu.
Não perdeu a essência! Manteve o seu espírito de garota; mas uma garota cheia de experiências de vida e de percepções de coisas, de gente, de mundo.
Ainda se intitula “a menina de olhos castanhos”. Mas agora tem a convicção de que é muito mais do que isso.
A mulher de belíssimos e profundos olhos castanhos! A mulher que, enfim, despiu-se de sua miopia moral.
Por LILIAN BARBOSA