CONTOS E MINICONTOS – A lenda da Tigris por Juliana Rossi

CONTOS E MINICONTOS – A lenda da Tigris por Juliana Rossi

Primeira parte – O guardião.

 Em um povoado de nativos na floresta úmida ao sul da asia, um pai de família chamado Norí, tem de apresentar sua filha Leona que acaba de completar 15 anos, para o líder da aldeia apontar quem será o seu amo, o Rakan a quem deverá sua obediência, lealdade e a própria vida.

 Norí tem cinco filhas. Leona é a mais velha, a primeira que ele deverá entregar.

 – Quem sabe se minha filha for uma boa serva, meu Deus Rakanadã me abençoe com filhos homens – Ele Pensa

 Com isso em mente, manda a mãe de Leona, Surya preparar a moça. Surya é uma mulher submissa que tem um amor imenso por suas meninas, e as ensina que guardem suas opiniões para si mesmas para serem agraciadas por seus Rakan e não sofrerem punições. Mas Leona tem uma força peculiar e sempre questiona por que os homens são superiores e por que eles que decidem tudo sozinhos. Surya lhes diz que é porque o grande Pai Rakanadã decidiu assim. Surya sabe que quando for preparar Leona, precisará mantê-la calma.

 A noite, a mãe de Leona vai até sua tenda, levando um chá de ervas calmantes.

 – Eu trouxe um delicioso chá para você. – Disse Surya, se sentando ao lado da esteira onde Leona estava deitada.

 Leona agradece e começa a beber. Logo Surya está com a menina deitada com a cabeça em seu colo, e diz:

 – Minha filha, está completando 15 anos, vamos começar a preparação amanhã para levá-la ao nosso líder Gowá, que designará o seu futuro Rakã.

 Leona já sonolenta diz:

 – Mas eu não quero me casar!

 – Essa é nossa missão, ser boas servas e boas mães. É uma mudança, logo você se acostuma – Diz Surya, acariciando e os longos cabelos da filha, já adormecendo.

 Pela manhã, ela volta com duas servas, para a preparação, ela é levada para um banho em flores e pétalas e óleos de cheiro adocicados, recebe massagem, lhes trançam os cabelos, pintam seus olhos, e lhes colocam um vestido branco, e que destaca a beleza da menina, de pele dourada e cabelos negros.

 Ao pôr do sol, seu pai chega para buscá-la, e diz:

 – Excelente, ela está linda! Certamente será dada há um poderoso Rakã!

 Leona tenta falar, sua mãe lhe corta, lhe abraçando e dizendo em seu ouvido:

 – Guarde seus pensamentos, não faça questionamentos, evite sofrer punição.

 A moça disfarça com um sorriso, mas seus olhos lacrimejam, e segue o seu pai, para se apresentar a Gowá.

 Já a porta da tenda, seu pai, diz:

 – Óh Gowá, tenho aqui minha primogênita, uma virgem para Radanakâ!

 Começa o som de uma flauta de bambú com uma melodia calma, mas triste. Norí conduz Leona pela mão e entram. O cheiro é adocicado pelo incenso, eles se sentam aos pês do seu líder. Ele olha fixamente nos olhos de Leona, por alguns minutos, e diz:

 – Vejo muitas dúvidas em sua mente, por isso lhe darei a um homem experiente. Seu Rakã será Nadesh! – Diz já se retirando, dando as costas.

 Leona é tomada de pavor. Seus olhos marejados, buscam seu pai, na esperança de obter ajuda, afinal Nadesh é um homem velho e conhecido por não ter piedade, nem com suas filhas e servas.

 – Pai, vai ser assim? – Diz Leona em prantos.

 – Sim, é seu destino. Ele tem muitas terras e animais. Seus filhos terão abundância, seja grata por isso. – Diz Norí com firmeza, encerrando a conversa.

 Eles saem caminhando. Leona está desconsolada e pensa em fugir, não quer aquele fim. Enquanto olha ao redor, avista a uma certa distância um tigre que a observa, e caminha lentamente de longe todo o caminho, até ela entrar em sua tenda, e ela sente um alívio inexplicável.

 Surya está na tenda esperando a filha, com o chá de ervas calmantes, Leona ao ver sua mãe corre abraça-la em prantos, e diz:

 – Eu não quero me casar, muito menos com o Velho e impiedoso Nadesh, me ajude por favor!

 – Calma minha filha, tome o chá, descanse para amanhã conversamos sobre isso com calma. – Diz Surya acariciando a filha e tentando acalmá-la.

 Ao sair da tenda observa o tigre deitado entre folhas alguns metros de distância.

 Ao amanhecer Leona solicita que sua mãe venha a tenda quer contar sobre o sonho que teve.

 – Mãe tive um sonho, um tigre grande me olhava de longe o tempo todo, seus olhos de fogo me transmitiam paz. O tigre caminhava lentamente me observando e parecia que mais ninguém além de mim o via.

 – Ontem à noite ao sair, havia um tigre deitado na folhagem olhando nessa direção, eu não senti nenhuma ameaça, ao contrário, senti paz! Minha filha, será que você tem um guardião? Sua vó contava de algumas mulheres que foram protegidas por animais da floresta!

 – Como saber, mamãe? – Pergunta Leona

 – Não conte isso a ninguém ainda, nem as suas irmãs, muito menos a seu pai.

 Naquele momento ouvem vozes de homens procurando por Norí, eram filhos de Nadesh. Surya chama seu marido e este vem rapidamente.

 – Viemos dizer que Nadesh quer fazer o casamento com sua filha daqui duas luas. – Diz um dos homens.

 – Mas é pouco tempo! – Diz Norí, preocupado.

 – Não se preocupe com nada, o grande Nadesh providenciará tudo para a cerimônia, e para você e sua familia. Ele já adianta com alguns presentes, ovelhas, cabras e terra. – Diz o homem.

 O outro homem traz uma caixa de madeira e diz:

 – Aqui está o vestido para a moça usar na cerimônia.

 Norí sorri e agradece, se curvando e aceitando os presentes.

 Leona observa de longe e vai para sua tenda preocupada e triste, não esperava que seria tão rápido. Suas irmãs veem até a tenda abraçá-la, compartilhando dos medos de Leona.

 Na hora da refeição, seu pai animado a abraça e diz:

 – Fui recompensado por ter uma filha, tão bela, espero que seja obediente e submissa, e mais bênçãos teremos.

 Leona sente um peso enorme em suas costas, além do medo do seu futuro Rakâ. Então ela sai andar na floresta, sobe a montanha e lá está perdida em seus pensamentos, ela olha pra baixo e vê o rio, com medo do seu destino se joga ao rio, na tentativa de acabar com sua vida. Bate na água já desacordada.

 Quando abre os olhos está à beira do rio, deitada com ela, cuidando dela está o grande tigre cujo pelos molhados revelam que a salvou. Com sua cabeça deitada no tigre escuta as batidas do coração, e se sente calma e protegida. Desliza a mão sobre o tigre, sentando-se olha nos olhos dele e vê fogo e chamas, que lhe dizem

 – Continue não desista. Sou teu guardião, você e sua descendência trarão livramento a suas irmãs.

 O sol já se põe, ela precisa voltar antes que a procurem.

 Continua…

Por JULIANA ROSSI

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pular para o conteúdo